terça-feira, 29 de maio de 2012

O património: novos valores culturais e histórico-sociais

O património, referência valorizante de uma sociedade, nas suas valências de cultura e como contributo para a construção e escrita da história social e económica, revela, como reflexo, a ideologia e mentalidade predominantes de cada época. O longo caminho das novas perspectivas da noção de património alcançou patamares diametralmente opostos, deixando de abranger somente o que dizia respeito aos grupos sociais privilegiados e alterando o paradigma das suas características aceites, nomeadamente monumentalidade e valor estético ou relacionado com as instituições do poder político e religioso.

Um dos potenciais símbolos patrimoniais, quer a nível do seu significado, quer do seu significante, pode ser um estrutura arquitectónica, mesmo que destituída da sua funcionalidade prática. Esse testemunho físico, ao mesmo tempo documento e guardião, transformar-se-á em memorial, passível de se ler como uma narrativa..Retendo e valorizando informações do passado entrelaçadas com significações do presente, têm a função de auxiliares da memória dos homens.

Hoje em dia, a mudança das mentalidades trouxe ao nosso convívio novos conceitos de património, nomeadamente o industrial, ainda tão desconsiderado pela maioria dos intervenientes e estudiosos e das políticas patrimoniais, sendo ainda incompleto e árido o entendimento cultural acerca do valor que possa conter um legado deste tipo. Tendo perdido o uso económico, essa carência e desvitalização é encarada como perda aceitável num processo de evolução social e económica do ciclo de vida produtivo de uma sociedade.

Fábrica de moagem do Caramujo, Cova da Piedade, Abril, 2010 (classificada como imóvel de interesse público em 1997; publicação: Diário da República Nº42-I Série-B, 19 de Fevereiro de 2002, Decreto nº5/2002)

Num processo de evolução ao longo das últimas décadas (perceptível até a nível legislativo), aceita-se que alguns desses testemunhos da técnica possuam valor patrimonial, tendo em conta critérios como a raridade ou a valência arquitectónica excepcional, assumindo-se que também a democratização alcançou a esfera do património e que os locais de trabalho e os maquinismos operados pelas classes trabalhadoras merecem inequivocamente entrar na esfera da salvaguarda ( Lei nº107/2001, que estabelece as bases da política e do regime de protecção e valorização do património cultural; publicação: Diário da República nº209, I Série-A, 8 de Setembro de 2001).

As populações, empenhadas em conhecer e valorizar a sua história local, devem conferir um novo sentido a esta herança, através do projecto que os novos sujeitos que dele se apropriam lhe quiserem ou puderem atribuir.
Conceição Toscano

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